quinta-feira, novembro 20, 2008

O jornalismo do costume

Uma notícia no Correio da Manhã de hoje, reza assim ( escuso dizer quem a assinou):

Ministério Público libertou homem que baleou PSP.

Durante uma rusga na noite de 7 de Maio, no Miratejo, Seixal, o agente da Esquadra de Investigação da PSP do Barreiro, Paulo ...., 32 anos, foi baleado no maxilar quando ia deter um traficante de droga. O agente – que é casado com a procuradora Maria ..., do MP do Barreiro – recupera com uma bala alojada no pescoço, mas o traficante que o tentou matar já está em liberdade desde o passado dia 7.

O suspeito, de 33 anos, foi libertado devido a um engano do Ministério Público do Seixal, sobre o qual a Procuradoria-Geral da República não quis esclarecer o CM. O magistrado terá pedido a especial complexidade do processo, para prolongar o prazo da prisão preventiva por mais seis meses. Mas como não emitiu um despacho formal dirigido ao defensor do arguido, Bruno Melo Alves, de modo a que este pudesse pronunciar-se, a falha resultou na libertação imediata do traficante e de outros três envolvidos no processo.

CORREIO DA MANHÃ | 20.11.2008

Um comentador, com pseudónimo Calimero, na revista InVerbis, escreveu assim:
Desconheço a situação concreta e a notícia também não ajuda muito, o que não espanta atendendo ao local onde foi inicialmente publicada.
O arguido foi detido e sujeito a prisão preventiva a 7/5/2008, indiciado da prática de crimes de tráfico de estupefacientes e de tentativa de homicídio (ou qualquer coisa lá perto).
Assim, de acordo com o artigo 215º, n.º 2 do CPP, o prazo máximo da prisão preventiva até à dedução da acusação era de 6 meses, terminando o mesmo em 7/11/2008.
Caso o processo fosse declarado de excepcional complexidade, tal prazo seria então elevado para um ano - artigo 215º, n.º 3 do CPP.
Essa declaração judicial de excepcional complexidade foi ser proferida oficiosamente ou a requerimento do MP - artigo 215º, n.º 4 do CPP.
A notícia dá conta que o magistrado do MP pediu a declaração de excepcional complexidade e se assim foi fê-lo muito bem, em cumprimento do disposto na lei.
Mas a notícia diz também que o MP se enganou, pois esqueceu-se de «emitir um despacho formal dirigido ao defensor» (?).
Ora, não se compreende o que é que isto possa significar, quando o que decorre da lei é que o MP requer ao JIC a declaração de excepcional complexidade e este, depois de ouvir o arguido e o defensor, decide.
Portanto, parece que se alguém se enganou ou se esqueceu terá sido o juiz de instrução, ao não ouvir o arguido, não se vislumbrando que esquecimento ou engano possa ser imputado ao MP.
Por outro lado, refira-se ainda que o título da notícia (MP liberta arguido) é certamente da autoria de quem não sabe do que está a escrever, já que os arguidos presos preventivamente não são libertados pelo MP mas sim pelo juiz de instrução.

Comentário: o Correio da Manhã, continua na mesma e não é de admirar. Em 5 anos tira-se um curso de Direito e aprender algumas noções básicas de organização judiciária, ainda leva menos tempo. Para quem conseguir aprender, claro.

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